A economia deixando de ser uma trava significará com certeza um ciclo de sucesso para a Construção Civil? Ou voltaremos a repetir o voo de galinha” que tivemos entre 2008 e 2013 onde a maior parte do setor amargou enormes prejuízos mesmo numa fase da economia com vendas bastante aquecidas e com abundância de financiamento?
Alguns sinais do mercado parecem indicar que aprendemos muito pouco com o ciclo passado e provavelmente estamos iniciando um período de euforia e de resultados que poderão ser novamente muito ruins. Os sinais são vários!
No último dia 5 de dezembro o leilão de CEPAC (Certificados de Potencial Adicional de Construção) da Operação Urbana Faria Lima atingiu um estratosférico ágio de 170% com o CEPAC sendo vendido a R$ 17.600. Com esse valor, grande parte de terrenos pertencentes a operação urbana se tornou cara, mesmo se forem entregues de graça. Como os valores atingiram valores tão absurdos? Muitas empresas estavam estocadas com terrenos nessa operação urbana e precisavam comprar direitos de construção de qualquer jeito. Novamente a máxima se repetiu: a melhor maneira de se perder dinheiro é ter empresas com muito dinheiro que precisa ser investido e diretor com meta de investimento e não de lucratividade.
Segundo informações do SECOVI-SP foram lançadas aproximadamente 42.000 unidades habitacionais durante o ano de 2019 na cidade de São Paulo, principalmente no segundo semestre. Isso significa que pelo menos 400 edifícios residenciais serão iniciados em meados do próximo ano, fora os muitos edifícios comerciais de grande porte que também serão iniciados. Uma grande demanda pressionando um mercado muito deprimido por 6 anos da maior crise que o setor já viu vai provocar situações de escassez semelhantes as que aconteceram entre 2008 e 2013? Para os serviços iniciais como escavação, contenções e fundações já está muito difícil contratar empresas para o primeiro semestre do ano que vem.
Vários terrenos em processo de negociação tiveram seus preços majorados em 50% e mesmo assim foram vendidos. Empresas incorporadoras estão acreditando em aumento no seus preços de venda por m2 em 25 a 30% para poderem pagar esses preços. Isso é posição empresarial ou aposta tipo jogo de pôquer?
Além disso, como as empresas incorporadoras e construtoras, que raramente se preparam para uma demanda futura, imaginam enfrentar a escassez de mão de obra que certamente acontecerá? As empresas cogitam em evoluir seu sistema construtivo e aumentar sua produtividade ou continuam pensando em empilhar tijolos? O custo de mão de obra para estruturas convencionais em concreto que estavam sendo contratadas no início desse ano entre R$ 450 e 500/m3 estão sendo contratados agora a R$ 600 e R$ 650 /m3 e já temos empresas estimando valores de R$ 800 para o 2º semestre de 2020. Como ficarão os desvios de custo com orçamentos feitos nesses valores? Essa expectativa de aumento de preços já está se alastrando para os demais serviços de obra. Já imaginaram onde encontrarão tanto pedreiro e gesseiro para empilhar tanto tijolo?
Exemplos de euforia que está acometendo o mercado não faltam, mesmo com os preços de venda evoluindo em níveis muito mais modestos. Os aumentos de custo acontecerão principalmente por falta de planejamento setorial. Embora tenhamos algumas informações da “inteligência de mercado” na área de produtos, vendas e financiamento (vejam excelente relatório ABRAINC – nov.2019), não temos qualquer “inteligência de mercado” na área de construção. A falta de liderança nesse setor é gritante. As associações de classe não prepararam o setor traduzindo as informações dos lançamentos e vendas para suas futuras demandas de serviço, materiais e equipamentos. Também não promovem discussões setoriais para identificar gargalos, combinar ações de investimento, capacitação e desenvolvimento de tecnologias. O hábito de empilhar tijolos tem feito nossos neurônios ficarem preguiçosos e vamos pagar caro novamente com isso.
A história nos ensina que nada aprendemos com a história. Podemos mudar isso?