Envelhecer significa aprender a conviver com a dependência — seja ela física, social ou espacial — e nesse longo processo, que sequer pode ser medido em anos, cada vez mais se entende que o envelhecimento está muito relacionado à genética, ao estilo vida, à localização e ao grupo socioeconômico. Por isso, trata-se de um processo muito diversificado, variando conforme cada indivíduo, com uma gama de interesses diferentes assim como capacidades e preferências no modo de vida.
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Entretanto, mesmo fugindo de generalizações, a preocupação com o envelhecimento da população tem se tornando pauta em diferentes disciplinas, incluindo a arquitetura. Segundo projeções da ONU, quase um terço da população (32,5%) terá 65 anos ou mais em 2050. No Brasil, uma projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que o número de idosos deve superar crianças e jovens em 2031. Já em 2050, o Brasil deve ser o sexto país do mundo com mais longevos.

Nesse sentido, entendendo a arquitetura como uma importante ferramenta para acolher esse crescente perfil de usuário, muitos estudos e intervenções têm surgido por meio de diferentes abordagens, não somente de cunho espacial, mas também social. Na concepção de facilitadores para as atividades diárias, criam-se estratégias de desenho universal permitido acessibilidade e conforto nos deslocamentos, assim como relações mais diretas com elementos naturais — vento, luz solar, vegetação. Contudo, além desses fatores, considera-se também aspectos subjetivos, como aqueles relacionados à integração, proteção e independência, procurando sempre fortalecer conexões sociais. O papel da arquitetura ao acolher esse público pode ser definido por meio de espaços que aumentem as possibilidades de um envelhecimento ativo com qualidade de vida, independência e sociabilidade, ou seja, ambientes que os integrem entre si e com a sociedade, longe da segregação e estigmatização. Levando em conta esse contexto, é possível perceber duas linhas de atuação dentro da arquitetura: a adaptação de edificações existentes e a concepção de novos projetos com qualidades específicas.

As mudanças nas edificações existentes estão sendo diretamente motivadas pelo envelhecimento dos seus moradores. Um exemplo interessante são os blocos de apartamentos em Ommoord, um bairro residencial em Roterdã, Países Baixos. Após 30 anos da sua construção (1968), os edifícios não atendiam mais aos padrões necessários, já que sua população residente sofreu uma considerável modificação demográfica. Com isso, em 1999, o escritório Hans van der Heijden Architect foi contratado para atualizar o desempenho técnico dos edifícios assim como encontrar uma solução arquitetônica para os diferentes perfis de moradores. Em um processo de co-design que envolveu os próprios habitantes e durou 9 anos, foram traçadas diferentes estratégias para repensar a organização espacial do edifício assim como redistribuir e seccionar os apartamentos de acordo com os grupos sociais. Por conseguinte, partes do empreendimento foram reservadas para os residentes mais idosos. Por exemplo, o térreo e as garagens se tornaram instalações de cuidados com a saúde, e foram adicionados outros apartamentos voltados para o jardim e um centro comunitário. Mais escadas e elevadores foram instalados para melhorar a acessibilidade dos apartamentos superiores e diminuir o comprimento dos corredores de acesso.

Uma iniciativa semelhante aconteceu no município espanhol de San Andrés del Rabanedo. Sob o comando do arquiteto Oscar Miguel Ares Álvarez — mesmo autor desse interessante projeto para residências geriátricas — o bairro de La Pinilla está sendo restaurado para que seus habitantes, dos quais 30% têm mais de 75 anos, possam permanecer em suas casas, bairro e ambiente familiar apesar da idade avançada. Trata-se da reforma de aproximadamente 500 casas que conta com o apoio do governo regional para adaptar e acolher a população mais idosa. A decisão está baseada na ideia de oferecer um envelhecimento saudável para seus habitantes, reduzindo custos econômicos e sociais que implicam a criação de lares adaptados às suas necessidades. Para o arquiteto, a casa do idoso deve ser compartimentada, com muita luz e espaço para armazenar objetos que fazem parte da sua história e, sobretudo, ser acessível sensorialmente. Álvarez explica que os idosos não apenas possuem dificuldades locomotoras, mas também sensoriais e a arquitetura pode estimulá-los por meio da cor, luz e textura, ajudando-os a conquistarem mais autonomia.

Entretanto, para além das adaptações, novos empreendimentos estão sendo construídos sob as premissas do usuário 60+. Neles estão incluídos apartamentos com serviços, habitações comunitárias e co-habitações como algumas fórmulas que vão além do conceito tradicional do lar de idosos, afastando-os da possibilidade de institucionalização. O termo conhecido como Aging in Place abriga as tipologias citadas acima e, em linhas gerais, permite que a habitação incorpore tecnologias que facilitem a vida cotidiana, sem aspectos improvisados ou adaptações, e também sem parecer uma clínica. Dentro do próprio empreendimento, além dos espaços que incentivam a socialização entre os vizinhos e a comunidade no geral, estão instaladas também empresas de atendimento que oferecem cuidados emergenciais e intensivos. O empreendimento BIOOS, em Curitiba, desenvolvido pelo escritório Ricardo Amaral Arquitetos Associados para a construtora Laguna, é um exemplo interessante desse novo formato pois agrega apartamentos voltados exclusivamente para a terceira idade (60+), espaços destinados a clinicas médicas e um embasamento com comércios e serviços direcionados a este público.

Há ainda aqueles que optam por uma velhice longe do caos urbano, como no projeto JIKKA, construído no Japão como uma morada final para as clientes — duas senhoras por volta dos sessenta anos —, um assistente social e um cozinheiro com espaços pensados como uma cabana primitiva.

Nessa linha, desenvolvendo o conceito de habitação compartilhada, o arquiteto alemão Matthias Hollwich, professor da Universidade da Pensilvânia, em seu livro New Aging: Live Smarter Now to Live Better Forever apresentou a ideia de flex living, apartamentos que possuem duas portas de entrada com dois quartos conectados por um espaço flexível. Com essa tipologia, Hollwich procura oferecer uma variedade de arranjos como dois amigos morando juntos ou um residente e um cuidador.

Entender a arquitetura sob a perspectiva da “nova terceira idade” tem sido um desafio, visto que essa mudança se refere a uma quebra de paradigmas. Muitos estudos apontam que envelhecer de forma saudável está relacionado à ideia de permitir que o indivíduo envelheça em condições semelhantes às que experimentou ao longo de toda a sua vida e este parece ser o caminho que a arquitetura deve seguir, seja adaptando edificações existentes, seja construindo novas.

Fonte: Archdaily Brasil