Como consequência direta desta estagnação, índices de segurança, qualidade, sustentabilidade e produtividade são relativamente baixos e não acompanham as demandas de transformação do mercado.
São muitas as peculiaridades da indústria da construção que colaboram para estes maus resultados, sendo que nos últimos anos algumas pesquisas ganharam bastante destaque na apresentação de ineficiências e oportunidades no setor.
Em 2017, A McKinsey & Company, em seu relatório “Reinventing Construction: A Route to Higher Productivity”, apontou para dez causas raízes distribuídas em fatores externos, dinâmicas da indústria e fatores operacionais de nível organizacional, que vão desde a regulamentação extensiva e a fragmentação do setor até o baixo investimento em inovação e P&D. Outra pesquisa que ganhou destaque, também apresentada pela McKinsey, colocou a indústria da construção entre os setores com o menor nível de digitalização.
Neste aspecto, desde então houve progressos para endereçar o problema – além da maior disseminação do BIM (Building Information Modeling), mundialmente houve uma crescente iniciativa de startups oferecendo uma vasta gama de soluções para a digitalização de processos de apoio à construção. Movimento este cada vez mais suportado pelo interesse dos grandes players do mercado e investidores, fazendo emergir um interessante ecossistema de inovação com grande viés na digitalização da construção.
Entretanto, para uma real exploração dos adventos de fomento à digitalização do setor, faz-se necessário, também, uma mudança em dinâmicas relacionadas aos sistemas de produção aplicados na construção civil, que por sua vez encontram obstáculos em atividades com uso massivo de mão de obra, muitas vezes com baixa qualificação.
Ao se fazer um paralelo com a manufatura, por exemplo, na qual a digitalização e o incremento tecnológico impulsionam a eficiência em alinhamento com os sistemas de produção, na indústria da construção, de uma forma geral, ocorre justamente o oposto, e a implantação de outras filosofias de produção encontram obstáculos ao se depararem com tecnologias e métodos construtivos obsoletos e centenários.
A industrialização da construção e a sua digitalização, quando aplicadas em conjunto, podem ser mutuamente potencializadas. Entretanto, o cenário que vemos atualmente desponta para um avanço em descompasso, no qual a digitalização encontra um caminho para crescer de forma sustentada, enquanto o desenvolvimento dos produtos e dos processos executivos de construção propriamente ditos ainda se deparam com as mesmas características e dinâmicas do setor já amplamente reconhecidas como gargalos para seu incremento de performance.
Neste sentido, existe ainda um importante gap tecnológico a ser preenchido no setor. O mais recente relatório da McKinsey & Company sobre o mercado da construção civil, intitulado “Next Normal in Construction: How disruption is reshaping the world’s largest ecosystem”, aponta mudanças importantes nas características do mercado que tendem a ser potencializadas no contexto do “novo normal”.
Tais características não diferem muito daquelas já previamente apresentadas em outros relatórios, sendo apontadas novas dinâmicas como resposta, em alinhamento com disrupções emergentes no setor. Dentre estas dinâmicas, destaco a mudança de visão orientada a projetos únicos, atualmente predominante, para uma visão orientada a produtos com forte ênfase no investimento em desenvolvimento tecnológico, não só no âmbito da digitalização de produtos e processos, como também em novos materiais e na industrialização da construção.
Existem atualmente diversas iniciativas pontuais focadas no desenvolvimento de soluções para atuar neste gap tecnológico da indústria da construção, porém ainda persiste a característica de fragmentação do setor, mesmo no âmbito da inovação tecnológica.
Para alavancar esta inovação nos métodos construtivos, existem grandes desafios a serem transpostos. Quando falamos em novas tecnologias no âmbito de componentes e sistemas da construção, por exemplo, o esforço associado à mudança é muito grande, uma vez que dentro de uma construção existe uma complexidade de subsistemas, materiais e componentes que necessitam de compatibilização em prol de um desempenho global projetado para a edificação.
Para cada mudança em um destes subsistemas, faz-se necessário todo um encadeamento de avaliações da extensão dessa mudança dentro da regulamentação vigente. Um contexto que poderia ser facilmente endereçado, não fosse justamente a característica de fragmentação do setor.
Esta complexidade potencializa ainda mais uma aversão ao risco já existente na construção, natural de organizações estabelecidas e amplamente regulamentadas, levando ao cenário de estagnação tecnológica de produtos e processos construtivos.
Como resposta a este cenário, além de se atentar para todas as futuras dinâmicas e disrupções do setor, que foram precisamente indicadas relatório sobre o “Novo normal da Construção” da McKinsey, é essencial se trabalhar de forma estruturada e sistêmica para que se tenha um posicionamento de vanguarda neste contexto de transformações.
Na Tecverde, que já tem uma história consolidada de desenvolvimento de tecnologias alinhadas com seu propósito de tornar o setor da construção civil mais industrializado e sustentável, a melhoria contínua nos produtos e processos construtivos é um fator-chave. Ao reconhecer as peculiaridades e desafios inerentes ao setor, foram adotadas estratégias que permitam uma ambidestria entre o foco na entrega de valor hoje e na criação de novos valores futuros.
Existem diversas iniciativas com eficácia comprovada em outras indústrias e com potencial de aplicação e/ou adaptação para a realidade da construção. Na Tecverde, decidimos estabelecer um squad multidisciplinar, composto por profissionais com experiências complementares dentro da empresa, para liderar a frente de criação de novos valores para a organização. São vários projetos de melhoria contínua e incremento tecnológico em produtos e processos construtivos, liderados por esta equipe em alinhamento com os especialistas das áreas funcionais.
Dentro ainda do âmbito organizacional, este time é suportado pela alta diretoria e conta com um comitê interno que avalia potencial e progresso destes projetos, bem como faz o elo entre o portfólio de projetos e a estratégia da organização, que em termos de desenvolvimento tecnológico é tangibilizada por um TRM – Technology RoadMap.
A máxima de que a inovação é um processo gerenciável torna-se ainda mais verdadeira e necessária dentro da indústria da construção, demandando que fosse criada toda uma abordagem integrada desde a concepção, exploração e avaliação de ideias, passando pela abertura e pelo desenvolvimento de projetos até a sua implantação, dentro de um funil de inovação com um RoadMap adaptativo ao contexto de maturidade de cada projeto e às peculiaridades e desafios do setor.
Para tanto, foi tomada como base a filosofia Lean Innovation, na qual se consiga enfatizar uma sistemática orientada à redução de desperdícios nos processos de exploração, criação e real conversão de novos valores para a organização. Esse objetivo é suportado pela adoção de práticas ágeis, colaborativas e visuais, que levem em consideração a maturidade do próprio projeto, para que sejam ainda mais adaptativas e enxutas.
A metodologia utilizada conta com um funil de projetos em um total de seis fases. Nas três primeiras, trabalha-se justamente a prospecção de oportunidades, por meio de um constante monitoramento de novas tecnologias externas de forma aberta com fornecedores, potenciais parceiros e benchmarking com outras empresas, com bastante encorajamento à experimentação e autonomia aos times. Uma vez que insights e ideias tenham sido convertidos em propostas de projetos, estes são submetidos à aprovação do comitê.
Na sequência, vêm as fases de desenvolvimento propriamente dito, onde uma exploração inicial é conduzida para abertura de novos projetos em colaboração com as partes interessadas internas e externas, a fim de determinar todas as funcionalidades que deverão ser comprovadas nos ciclos iterativos e incrementais de desenvolvimento.
Todo este ciclo tem o acompanhamento do TRL (Nível de Maturidade Tecnológica), método consolidado em projetos de P&D que foi adaptado ao contexto do setor como uma forma de trazer maior alinhamento entre projetos e as normas regulamentadoras, como as normas de saúde e segurança no trabalho e a NBR 15.575 (2013), referente à Norma de Desempenho de Edificações Habitacionais.
Por fim, já com a tecnologia do projeto desenvolvida e madura, inicia-se um ciclo preditivo visando a introdução do novo produto e processo como forma de proteção da produção e acompanhamento dos resultados até a sua estabilização.
De modo geral, estas são algumas das iniciativas que enxergo com potencial para driblar as barreiras inerentes às dinâmicas do setor e, assim, garantir uma melhoria contínua embasada na inovação e no incremento tecnológico como estratégia competitiva para exploração das sinergias entre os avanços na digitalização e os progressos em tecnologias habilitadoras da Indústria 4.0, em consonância com a utilização de novos materiais, componentes e sistemas que culminam em produtos e processos construtivos mais eficientes e sustentáveis.
Fonte: smartus.com.br